Passam
os rostos
na rua envelhecida pelo tempo,
desgasta pelas vidas que na vida correram...
quantas nelas nasceram
e saudosas morreram,
mas a rua, sempre nos abraça e
nos quer,
arrecadora de desabafos de quem
nos fere.
Passam os rostos cansados que a
vida lhes deu,
os olhares tristes da saudade de
quem já foi seu...
mágoas sentidas,
quantas ainda retidas,
nostalgia daquelas suas queridas
vidas.
Passam os silenciosos seres,
os portadores de sonhos nascidos
nas auroras...
eles sonham, sonham na alegria da
felicidade
como crianças brincando e rindo
na despreocupada vida que lhes
vem vindo.
Rostos de silenciosos seres
que guardam o Universo dos
sentidos,
quantos neles passados e vividos
no turbilhão dos ventos corridos.
Mas como passa o rosto do pobre
já cansado,
desanimado,
na rua abandonado, aí posto,
com a mão estendida e envergonhado
rosto;
o olhar entristecido, enevoado,
à procura da esmola querida.
Ser que a alma desassossegada
suportou
depois de quem a tantos amou.
Este, quantas vezes pobre
será?...
se no coração amor não ficou.
Ali passa o Doutor de ar
desdenhoso,
autoritário e fogoso
na velha rua de casas
envelhecidas
onde o débil velho de cabelos
grisalhos,
com a face enrugada de tantos
orvalhos,
o que a vida fugaz apenas lhe deixou.
Passam os rostos embebidos das
aguas salgadas,
os lutadores da inquietude das
ondas marulhadas...
os que no mar a vida procuram,
mas no mar, quantos suas vidas se
afundam.
Passam os morenos rostos dos
campónios,
agora, poucos são e eram
tantos...
Passa o operário laborioso,
o funcionário do Estado, brioso;
passam quantos e quantos
como são tantos o que na rua
passam
e a existência enlaçam.
Passam seres do Outono
que ainda querem viver,
quantos curvados, enrugados,
historias felizes e de sofrer.
Passam os seres da Primavera,
as crianças que levam os beijos
da Aurora
no pulsar dos corações onde o
amor mora;
a juventude com o calor da vida,
da esperança...
confiantes, passam na ventura que
alcançam,
acreditando sempre num futuro
melhor...
a força que eles sabem
conquistar.
nas calçadas polidas da rua.
Aí ficam gravadas quantas
historias
que na vida lhes passou,
quantos lamentos e lágrimas nelas
derramaram.
Os rostos passam e sempre
passarão
com a brisa do mar desta terra,
e silenciosos ficam os portais da
ruas,
como marcos das memorias suas.
Em cada rosto, está gravado o seu
passado
como livro que na vida sofreu e
foi amado;
não desfolhes as folhas para
recordar,
porque podes encontrar alguma
palavra acusada...
Valdemar Muge
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